Um blog cheio de ideias. Algumas soltas... outras nem tanto! Foi a forma de uma copy perdida se encontrar, finalmente, com as suas palavras... E consigo mesma.

Monday, June 17, 2013

IPO




Instituto Português de Oncologia - Passo por ele quase todos os dias, agora ao lado, dando graças a Deus por não ter de lá entrar.
Mas sempre com o coração apertado pelas memórias que ali vivem, encarceradas naquele edifício enorme, horrível, mesmo no meio da cidade.
Durante alguns anos tive de o conhecer e enfrentar. Tive de lá entrar, quase sempre com a respiração ofegante e a alma completamente perdida.
Sei que bloqueei muito do que ali se passou, porque a dor e o sofrimento foram tão grandes que chego a agradecer não me lembrar de tudo.
Quando passo por ele, olho-o de lado, com um rancor que desejava não sentir e, se o sinal estiver fechado, é mais do que certo que sou assolada pelas lembranças.
O cheiro a amoníaco, os lamentos pelos corredores, os gemidos baixinhos e tão sofridos, as batas dos doentes, o som das rodas dos suportes para o soro, os olhares baixos e sumidos...
Guardo em mim recordações que magoam quando lembradas, de tão reais que se tornam. Já passaram mais de 15 anos mas às vezes, do nada, elas aparecem! Pensava serem todas más, mas não são.
Hoje lembrei-me de um abraço que me fez sorrir...

Depois de mais uma visita à minha Mãe saí do quarto dela e, como sempre, vinha atordoada, revoltada, magoada, zangada... Quando saía dali queria poder voar para desaparecer o mais rápido possível mas naquele dia precisei de me sentar um bocadinho.
Tal como já me tinha sentado tantas outras vezes nas escadas de serviço, nas casas de banho, no chão de um corredor mais escuro... Às vezes tinha mesmo de parar, fosse onde fosse, esconder-me, só para chorar um bocadinho e voltar a respirar sem sentir aquele aperto horrível que me sufocava sempre que lá ia.
Naquele dia enfiei-me numa das muitas salas de espera, a primeira que me pareceu vazia. E sentei-me sem reparar se lá estava mais alguém.
Só precisava de estar assim um bocadinho, como que a tentar encontrar uma calma que já não existia, um caminho que naquela altura era impossível de imaginar.
Tinha a cabeça baixa e as lágrimas caiam tão rápido e tão descontroladas como a minha mente.
Não deve haver nada pior na vida do que visitar uma mãe moribunda... Eu, felizmente, ainda não conheci nada pior, a não ser a própria morte.
De repente, mas sem me assustar, senti alguém a sentar-se ao meu lado. Levantei os olhos e era uma mulher. Não me lembro da cara dela, nem da idade. Não me lembro de nada! A não ser do seu olhar e do abraço que me deu, e que me confortou tanto como se fosse o da minha própria Mãe.
Não a conhecia, não sabia nada dela, mas de repente ela deu-me tudo o que eu precisava.
Não sei quanto tempo passou, sei que chorei e chorei e chorei até me cansar de chorar. E ela abraçou-me esse tempo todo, em silêncio.
Lembro-me de ter ficado envergonhada e de me despedir dela apenas com um sorriso. Aliviada.
Acho que nunca mais a vi, e mesmo que a visse não a deveria reconhecer.
Para mim foi um Anjo e o que aconteceu naquela sala foi um milagre.
Tal como tantos outros que aconteceram e acontecem todos os dias dentro daquele edifício enorme, frio e horrível.

Hoje, e apesar de tudo, foi bom recordar...