A uma amiga (muito amiga)
Eu nem podia acreditar no que os meus olhos viam...
Seria possível? Passaram tantos anos, e agora... assim sem mais nem menos, aí vinha ela, radiosa, descendo a rua, calma e serena, como sempre a recordo, tão linda e segura no seu andar, virando a cabeça dos homens que cruzavam o seu caminho...
É ela! É a minha Cristina... agora que fixou o seu olhar em mim, e reconheço nele a sua alegria.
O meu coração disparou, os meus olhos encheram-se de lágrimas e a minha voz deu lugar a um sussurro embargado de emoção.
Abraçámo-nos! Não dissemos nada. Nada!
Olhámo-nos durante minutos que pareceram segundos, sorrimo-nos uma para a outra... Nos seus olhos eu vi-me a mim, e ela viu-se nos meus...
Para quê falar?
Abraçámo-nos outra vez... Com tanta emoção que comecei a chorar...
Lágrimas repletas de saudades daquela amiga, dos momentos e segredos que foram só nossos, das loucuras e sentimentos que trocámos, dos desabafos, dos risos, das baldas, dos namorados e das cábulas...
Tanta coisa... tantos anos... ...e parece que foi ontem...
Descíamos a rua juntas a caminho de casa, ríamos que nem umas perdidas com disparates sempre novos, partilhávamos gostos e desgostos...
Éramos tão amigas! Tão amigas!...
Encontrávamo-nos às 7 da manhã, duas vezes por semana, antes das aulas, porque ela baldava-se ao curso de inglês que o pai a obrigava a frequentar e eu acordava mais cedo só para lhe fazer companhia. Nesses momentos solidários fumávamos como gente grande, e falávamos... Conversas que nunca tinham fim, sempre com as mesmas personagens, os mesmos sonhos e ambições, as mesmas raivas e frustrações...
Como é que nos afastámos tanto Tininha? E afinal estiveste sempre aqui... Reconheço isso hoje, quando te abraço e sinto que nunca te deixei partir...
O teu olhar azul sempre me confortou, a tua voz amiga, os teus carinhos que chegavam sempre quando eu menos esperava, e mais precisava...
Então falaste... mas não te consegui ouvir.
Concentrei-me e olhei-te mais uma vez. Sorriste ternamente e envolveste-me num novo abraço, este com sabor a despedida, a tristeza, a solidão.
Porquê? Ainda agora nos encontrámos... e eu preciso tanto de ti, e tenho tanta coisa para te contar...
Quis-te fixar mais uma vez, mas quando te larguei não te consegui mais agarrar... vi-te sumir, como se fosses um anjo azul, num céu azul...
Desculpa Cristina. Só espero que estejas bem...
...e que me continues a visitar sempre que puderes, de preferência num sonho sem fim, diferente deste...
(A Cristina morreu, num acidente de viação, no dia 25 de Outubro de 1997)
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